A Odisséia das Lentes de Contato

Monday, May 30, 2005 1:22 PM Posted by Lucas Welter 2 comments
Capítulo especial e fora de ordem (como tudo na minha existência...)
[isso aconteceu no final de setembro começo de outubro]

Lembram quando eu disse que aqui a responsabilidade é de quem vende as coisas e não de quem compra? Pois é, pelas leis americanas (sou leigo em direito – apesar da carga genética - , meus amigos juridicamente corretos me corrijam...), o consumidor é sempre otário e enganado, então quem vende é que tem que certificar que o consumidor otário e enganado não vai fazer besteira com o produto dele e processá-lo depois. No Brasil não vamos escapar disso, pois nosso código de defesa do consumidor nos induz ao mesmo caminho, mas por algum tempo, até a moda pegar ou sobrarem advogados no mercado, ainda estaremos imunes. Vou explicar.


Tentativa #1 para comprar lentes de contato.

Vou até o WalMart*, o único lugar em State College onde tem as maravilhosas lentes de contato descartáveis Acuvue 2 da Johnson & Johnson (sim, eles estão me pagando para escrever isso...). Ao tentar comprar, fui informado que precisava da receita, ^ironia on^ igualzinho como me pedem nas Íris Color da Rua da Praia ^ironia off^. Ok, voltaria outro dia com a receita. Realmente é muito mais barato.

* (leiam a semana passada, onde relato como é fácil chegar no Walmart...) (comentário – ok, perdi esse texto, mas vou dar uma dica: 25 minutos em um ônibus que só passa de hora em hora. Ou seja, chegando no Walmart, mesmo que eu resolva minha vida em 5 minutos, tenho que esperar outros 55 pelo próximo ônibus.)

Tentativa #2 para comprar lentes de contato.

Vou eu novamente ao WalMart, munido da minha receita de lentes, que a Doutora Daniela preparou com muito amor e carinho. Chegando no WalMart, me informam que na receita não tem a tal da Base Curve. Informo que no Brasil não tem problema, que só tem um tipo de lente, etc, etc, que a minha é 8.7, e nada. “Se não tá escrito, não posso vender” disse a vendedora. Após chorar um pouco ela me explicou essa história que aqui no USA as pessoas processam com muita facilidade. Indústria do processo diria a minha mãe no Brasil... Volto para casa frustrado.

Tentativa #3 para comprar lentes de contato.

Vou eu pela terceira vez, munido da receita com um apenso (tô jurídico hoje...) um Post it com a tal da curva base. Chegando lá, a vendedora (a essa altura conhecia todas) verifica no computador, aceita a trambicagem do Post it, mas descobriu que faltava outro maravilhoso dado na receita... Mandei ela escrever tudo o que ela queria na receita e disse que ia falar com a minha médica no Brasil e que ela mandaria por email a receita. Não, querido, por email não serve, tem que ser por fax. Expliquei que minha geração não conhecia fax, que fax era algo que minha mãe adorava e não eu. Sem discussão, ou vem por fax ou nada feito. Incomodei a queridíssima Dra. Daniela que fez a gentileza de mandar a receita por fax.

Tentativa #4 para comprar lentes de contato.

Tá, fui al disposto a quebrar pelo menos uma vitrine caso não saísse com as lentes. E foi por pouco. Chegando lá, a tradicional fala: remember me? - No, disse a criatura. Minha sorte foi que outra lá de trás disse: I remember you! Tua receita chegou por fax... Depois de muito procurar, ligarem para supervisora, pensarem que acharam a receita, acharem de fato a receita. Então a melhor: não é que eles não tinham a lente em estoque? Mandaram eu voltar outro dia. No way. Mandei verem na outra loja, do outro lado da cidade e mandei trazerem. Esperei meia hora, mas sai de lá com as lentes. Agora estou cadastrado no sistema. Posso comprar lentes em qualquer WalMart do USA sem receita... Por um ano.

Conclusão

Após muito conversar com o Mike sobre o assunto e ele agüentar a minha frustração e ter se oferecido para ir até Altoona (40 min) para irmos numa ótica de bairro e passar uma conversa na vendedora, entendi um pouco mais sobre essa confusão que é a questão da responsabilidade por aqui. Os americanos não querem mais saber de responsabilidade nenhuma, só querem saber dos seus direitos. O que é muito legal e era uma das coisas que eu admirava nos USA, comecei a ver como outros olhos. É só a gente olhar ao redor e ver que tudo é uma grande desculpa para ninguém assumir nada do que faz no país. Prova disso é a eleição que se aproxima. Tenho pena das gerações futuras aqui nos USA. Mas pelo menos tenho lentes de contato.

Do baú. Lezioni Americani

Thursday, May 26, 2005 7:28 AM Posted by Lucas Welter 0 comments
Publicado originalmente em 7 de outubro de 2004, 11h30min PM

Tinha prometido para mim mesmo que quando passasse a entrega de projeto dessa semana iria atualizar o blog...

Quase virei a noite [do jargão arquitetês virar: passar a noite acordado] passada preparando o painel de projeto. Hoje meu grupo foi o segundo grupo a apresentar, foi muito legal, levamos quase 50 minutos entre apresentação e comentários, tentei fazer algo bem interativo, envolvendo a turma, mas conclui que o inglês, quero dizer o idioma de forma geral, não ajuda muito. Inglês é um idioma muito monótono, sem grandes entonações para fazer uma mega apresentação. Quem quiser discordar, estou às ordens.

Tudo aquilo que conversei e aprendi com o Lineu foi colocado em pratica numa análise muito interessante sobre as estratégias de revitalização da Regent Street em Londres. O trabalho se chamou “Main Streets Under Control”, sendo esse control, bom, com vários significados.


Segunda-feira, 27 de setembro

Primeira etapa de projeto. Análise da área. Meu grupo acabou se entendendo no domingo depois de um começo traumático e fizemos um excelente trabalho. Acho que dei sorte, estava com os melhores alunos da sala no grupo, meio que por acaso (e não sabia...). São os professores que escolhem os grupos e eles trocam de etapa para etapa. Algo novo para mim. Assim, todo mundo trabalha com todo mundo, porém nunca tem nenhum resultado excepcional, pois os melhores estão sempre espalhados e não unidos em um super grupo... A aula foi enorme, das 13h30min às 18h, professores convidados, convidada externa com comentários toscos, enfim, um acontecimento.

Nosso professor fez a gentileza de comprar queijos e uvas para tornar a tarde menos dolorida. Bom, estou me queixando a toa. Os dois professores são o máximo, posso até afirmar que isso tudo está valendo por eles. São muito tranqüilos em termos de ritmo, estão presentes o tempo todo (3 vezes por semana das 13h30min às 17h30min), ficam na sala de aula, se marcar hora estão a disposição, são super eruditos, conversam qualquer coisa e são muito apaixonados por arquitetura. Alem disso têm um repertório fantástico, estimulam a gente a saber e ler mais, trazem muita coisa para aula, relacionam com o que está acontecendo no mundo em termos de arquitetura, realmente estou gostando.

Dando um exemplo, estamos fazendo um caderno/livro da turma toda sobre o projeto de Harrisburg, é o Harrisbook (haja marketing...). Estamos usando Adobe InDesign. Como ninguém sabia usar, deram uma aula de InDesign pra gente. Dão altas dicas de como trabalhar com imagens e arquivos pesados, corrigem nossa postura corporal na hora de apresentar e consertam o inglês de todo mundo, afinal americanos também não falam inglês, ^ironia on^ igualzinho à UFRGS ^ironia off^... Mas eles também são exceção. Aqui também tem professores malas.

Não mencionei, mas tem computador pra todo mundo, logo a aula de InDesign pode ser dada. Já no Brasil... porém vejo isso como uma vantagem: nós temos que nos virar bem mais que essa galera daqui. Temos que correr atrás, nada cai pronto. Tudo para eles parece difícil caso tenham que se mexer um pouco. Lições Americanas. Explicações culturais para outro dia, os comentários perderiam a graça com explicações técnicas...


Terça-feira, 28 de setembro

Como na quarta era aniversário do Jeff, e ele estava fazendo 21 anos, ficamos acordados até a meia noite para comemorar. O Jeff é o bebê da casa. Fazer 21 anos é muito importante, porque significa que se pode sair e beber em bares. É muito sério. Na primeira noite que saí, deixei meu passaporte em casa. Tive que voltar buscar. Minhas outras 3 identidades não valiam... Here we only accept the Pennsylvania Driver’s License, any other US state or Canadian Driver’s license or a valid passport – disse o gorila da porta. Gostei do detalhe do passaporte válido... Desde então, toda vez que vamos sair, alguém me lembra do passaporte. Os caras conferem mesmo, olham mesmo para ti e para a foto várias vezes e ainda fazem contas para saber a idade da gente. Alguns seguranças menos privilegiados em matemática tem até uma calculadora... Desde a semana passada, passaram e exigir o cartão da universidade em função da foto atualizada.

Por que tão rígidos? Aqui a responsabilidade é de quem vende as coisas e não de quem compra. O consumidor é sempre otário e enganado, então quem vende é que tem que certificar que o consumidor otário e enganado não vai fazer besteira com o produto dele e processá-lo depois. Pensem nos filmes que vocês já viram sobre isso. Ainda volto para esse tópico.

Bom, meia noite o Jeff fez 21, a gente deu um banho de champanha nele e arrastamos o coitado para o bar mais próximo de casa no intuito de deixá-lo em coma alcoólico. Devo dizer que quase fomos bem sucedidos. No meio da madrugada o Mike achou ele dormindo no banheiro... Fomos sucessivamente pagando bebida para ele até o bar fechar, às duas da manhã. Sim, aqui os bares fecham às duas. Lei. Na verdade eles tem que parar de vender bebida alcoólica às duas da manhã, o que dá quase na mesma que fechar... Vai todo mundo para casa. É legal porque a gente não se acaba tanto e está mais inteiro no dia seguinte, apesar de ser bastante fácil de se acabar antes das duas. Uma questão de doses...


Quarta-feira, 29 de setembro

Noite, jantar na casa do coordenador do nosso projeto aqui na Penn State, professor Michael Rios. Mora com e esposa e filha numa casa bem legal, passando o campo de Golf da universidade. Sim, a Universidade tem dois campos de Golf, onde os 500.000 alumni podem jogar nos finas de semana quando voltam para State College para relembrar os anos da pós adolescência nesta cidade universitária... Bom, a vizinhança do professor Rios é das mais tranqüilas, reduto de professores e famílias felizes (primeira classe), longe da confusão dos estudantes (classe econômica).

A vantagem é dá para ir a pé de casa, só cruzando o campo de Golf. No convite da nossa orientadora dizia: Lucas will make his famous caipirinhas, the delicious Brazilian drink. Casa lotada...

Jantar legal, convidados legais e os assuntos variaram entre problemas de infra-estrutura no Brasil e porque usar roupas largas é legal. Na verdade não é legal, é mais barato para indústria, que só tem que fazer uns três tamanhos: largo, bastante largo e exageradamente largo. Segundo meu professor, um crime, pois é o único momento das nossas vidas que estamos com o corpo no lugar e que podemos exibir nossos dotes, porém a indústria da moda nos convenceu que o legal é esconder tudo atrás de roupas largas... não perdi o sono por isso, mas o ponto dele não deixa de ter fundamento. Garanto que não foi decorrência das caipirinhas. Minha orientadora arrumou uma Velho Barreiro Gold...


Quinta-feira, 30 de setembro

Acontecimento do dia: prova de fotografia. Quatro páginas de Susan Sontag, história da fotografia, lentes complexas, e exercícios técnicos. Resultado, o professor disse que quem acertasse 50% estava no topo. Ontem recebi minha prova de volta: 56%. What a shame para um mega graduado no assunto!

Hoje fui ao supermercado com os guris. De longe o supermercado mais legal que já entrei (e olha que eu sou viajado... depois entrei em outro mais bacana em Chicago, mas um pouco caro...). Umas duas vezes o Zaffari da Lima e Silva, muito legal, muito bonito, ecologicamente responsável, sem sacolas plásticas, só saco de papel, ambiente muito aconchegante. Passaria a tarde lá. Uma coisa que me impressiona aqui nos USA é a variedade de coisas e de produtos. Meu vocabulário não dá para descrever.

Mas de verdade, o grande acontecimento do dia foi o primeiro debate Bush-Kerry. Estamos preocupados com o Kerry. Não sei se vai ser dessa vez. O cara é bom, articulado, mas o Bush tem um carisma que ninguém consegue explicar. Acho que porque ele é limitado, como o Lula, então a população se identifica. Fala as coisas sem pensar, sem ter medo das conseqüências. Acho que as pessoas gostam disso. Novamente usaria conceitos culturais para explicar isso, mas Hofestede que me perdoe. Já o Kerry vem da elite (Boston vs. Texas...), tipo o Serra. Além disso, tem o maluco colégio eleitoral, em que quem ganha no estado, ganha todos os votos. A Pennsylvania é um dos estados de guerra, tem uns 32 membros no colégio e o Kerry tá com vantagem de 1 ponto. É um dos estados visados pelo tamanho do colégio e não é nem democrata convicto como NY nem republicano amalucado como o Texas. O Bush só fala do “terror”, aliás esse foi o tema do debate. Gostei muito do Kerry, até o inglês dele é muito superior. As pesquisas também estão confusas, tá tudo meio embolado. Não sei se é verdade ou se não querem se comprometer depois do fiasco da última eleição onde a CNN anunciou uma coisa e deu outra. Aliás, dá para levar a sério um sistema eleitoral onde a totalização dos votos é feita pela CNN?


Sexta-feira, 1 de outubro

Aula muito bacana, simulamos sem saber um assembléia de bairro, se é que isso pode ser legal. Meio que sem querer. Fizemos um exercício muito rápido e começamos a votar de forma exaustiva todas as questões possíveis relacionadas com o exercício. Lá pela décima segunda votação as pessoas votavam por votar, sem se importar com o conteúdo. Qualquer semelhança com a vida real é mera coincidência. Democracia levada aos extremos pode dar dor de cabeça, alem de perder o rumo. Fomos liberados uma hora mais cedo para curtir o final de uma sexta-feira de sol, uma das últimas antes do inverno. Não que o sol desapareça no inverno, mas nessa latitude, às 4h já vai estar escuro demais para fotossíntese...


Sábado, 2 de outubro

Dia em Washington com a cadeira de fotografia visitando a National Galery.
Eu + Washington + tempo bom = impossível.

Sábado à noite tava um frio desgraçado, mesmo para um gaúcho da serra: 5 graus. Foi a média desde então. Durante a noite, entre 4 e 5 graus e durante o dia não passa dos 12, mesmo com um solaço lá fora. Noite no Bar Bleu, onde o Mike toca guitarra numa banda de Jazz. Corcovado em minha homenagem. E como sempre Kansas City. Jazz lovers, babem.


Domingo, 3 de outubro

Dia de acordar tarde e fazer faxina em casa. Mutirão: aspirador, banheiros, cozinhas, todo mundo ajudou, pela primeira vez desde que estou aqui...

Bom, vou parar por aqui para acabar uns trabalhos para o AFS. Estarei no Brasil na semana que vem para a Convenção Nacional do AFS. Mas coloco no ar as fotos da Falling Water antes disso.

Sobre o blog

Wednesday, May 18, 2005 9:00 AM Posted by Lucas Welter 0 comments
[esse post perdeu completamente o sentido... escrevi ele quando estava meio azedo... mas não vou me justificar... vou colocar um pouco de cor... mas só nas fotos!]

Se alguém espera ver por aqui textos poéticos de como a vida é linda, já vou avisando, tchau!

Mas também não se preocupem, não tenho a veia trágica. Como em Melinda & Melinda (Woody Allen, apesar das tiradas cômicas do filme ainda não decidi se gostei ou não...), tudo pode ser contado sob o ângulo trágico ou cômico. Optei pelo cômico, pelo sarcástico, pelo ácido (ou meus melhores amigos não me reconheceriam...). E antes que comentem, sim, tenho uma coleção pessoal de pontos, travessões, parêntesis e sinais gráficos diversos.

Porém, eu sou um cara do bem, já que ele sempre ganha no final. E como eu sempre ganho no final ou dou um jeito de ganhar, logo eu sou do bem. Bem convencido.

PS. Sobre o design, vai ser clean e ponto. Mais do que o anterior. E as fotos preto e branco. Minimalista. Mínimo. Se tu gostas de Casa Cor e outros malabarismos, problema teu.

Me explicando...

Monday, May 16, 2005 9:29 AM Posted by Lucas Welter 2 comments
Tá, montei um blog, e daí? Como estou me sentindo ridículo, vou me explicar. Ter que me explicar também me faz sentir ridículo, mesmo assim vamos em frente.
Por que um blog? Por mera preguiça.

Acompanho blogs há algum tempo e achei que era uma boa idéia enquanto estivesse nos USA, afinal, não queria perder vínculos com as pessoas que tenho por perto. E como não queria passar dias escrevendo emails personalizadíssimos (embora alguns amigos de verdade mereçam...), achei que pouparia tempo. Foi por mera preguiça mesmo.

O blog fez sucesso enquanto durou. Agüentei uns 3 meses. Depois cansei e o meu semestre apertou. Acabou ficando mais fácil escrever uma porção de emails de duas linhas para galera que uma porção de linhas no blog. Depois me senti culpado de não ter continuado. Já avisei, estou me explicando e me sentindo ridículo... Então, quando quis me redimir, a Globo tinha tirou meu blog do ar por falta de atualização (agora lembrei do Brizola e quanto ele odiava a Globo... fiquei com um sorrisinho debochado no rosto...). Bom, recuperei alguns textos em que eu achava graça das coisas que me aconteciam (e elas de mim...) e resolvi republicá-los.

Vamos ver como isso acaba...